O Homem de Gelo agora é gay – e eu com isso?
Então, “história longa – curta”, o Homem de Gelo agora é gay. Você pode ler tudo em detalhes lá no Bleeding Cool.
Pra quem tem preguiça, eu faço um resumão: vazaram algumas páginas de All New X-Men 40, do Brian Michael Bendis, onde um dos membros fundadores da equipe mutante – Bobby Drake, o Homem de Gelo – saiu do armário. Não, não é “O” Homem de Gelo, é aquele-que-veio-do-passado-e-agora-está-no-presente.
“E eu com isso?”
Então, primeiro vamos aos fatos: embora quem tenha se assumido seja o Drake-do-passado, ele na prática é o mesmo Homem de Gelo que habita o universo 616 nos últimos quarenta anos.
Ou seja, uma vez que orientação sexual não é escolha (e se você discorda disso, parabéns campeão) e os dois personagens são a mesma pessoa – apenas em momentos diferentes da vida – Bobby Drake está vivendo uma mentira nos últimos quarenta anos nas HQs. Complicado, hein?
Na revista, Drake é confrontado com a Jean-Grey-do-passado sobre sua sexualidade, pois a telepata teria visto isso em sua mente. Drake acaba admitindo, não sem antes sugerir que sua contraparte futura mantém uma orientação heterossexual de fachada como maneira de se proteger do preconceito.
Ou seja: é mais fácil ser mutante do que gay nos Estados Unidos dos anos 60.
A notícia já repercutiu na gringa, inclusive na comunidade LGBT norte-americana que já especulava sobre a sexualidade do personagem faz muito tempo, como mostra uma matéria do The Nerdist.
“A não ser, claro, se você for um leitor gay, onde neste caso o debate sobre a sexualidade de Bobby já circula por anos desde os primórdios da internet, e provavelmente mesmo antes disso. Para nós, a evidência apontava para um Homem de Gelo hétero por décadas em todas as páginas da Marvel. A razão para a dúvida reside no fato de que seus relacionamentos com personagens femininos parecem as tentativas desajeitadas que vários homens gays cometem quando estão em negação profunda. O pobre Robert Drake apresenta todos os sintomas disso”
O artigo relembra relacionamentos do personagem durante sua história, seja com a também mutante Cristal, com personagens secundárias (Opal Tanaka) ou mesmo com a Vampira, durante os anos noventa – todos mal-sucedidos, onde suas parceiras simplesmente se afastavam por falta de interesse.
Ainda que possa se levantar uma objeção – a de que esse distanciamento reflete a metáfora fundamental que traz um “homem de gelo” – o artigo lembra que durante a passagem de Chuck Austen pelo título mutante nos anos 2000, o personagem Estrela Polar (também gay) chega a se interessar por Drake e quando confrontado com a heterossexualidade do herói, é respondido por outro personagem de que o Homem de Gelo poderia sim ser gay e que “apenas ainda não sabe disso”.
“Mas e daí? Fizeram um retcon, o cara é gay, caguei, já vi isso antes” – errado. Viu, mas não dessa forma.
Primeiro que é importante mostrar que Bendis não tirou essa ideia do rabo – já havia um precedente na cronologia do personagem, bem como todo um fandom receptivo à idéia, como o próprio Bendis afirmou em entrevista ao CBR.
“(…) Nós tivemos algumas pessoas dizendo, ‘mas que diabos você está falando, de onde é que isso veio’ Enquanto outras não ficaram nem um pouco surpresas. Inclusive já houve no Tumblr – e eu não vou dar repost nisso até o final da semana – pessoas que postaram verdadeiros mapas de painéis com coisas que Bobby fez nos últimos 50 anos que provam o ponto que eu sempre pensei que era óbvio, e que muitos pensaram ser também.
(…) É como sexo e política – as pessoas só verão aquilo que quiserem ver.”
Depois que pela primeira vez teríamos um personagem “de primeira categoria” – criado na primeira leva de heróis da editora – trazendo uma questão dessas à tona, coerente com seu passado e seu conceito (do homem que se oculta atrás de uma camada de gelo), como também disse, em entrevista à MTV, o editor encarregado da Marvel, Axel Alonso.
“Esse é um personagem com décadas de história, que nós vimos falhar no campo romântico – mais de uma vez. Então os indícios sempre estiveram lá (…)A viagem no tempo nos deu uma plataforma para descobrir as jornadas pessoais dos personagens enquanto jovens.”
Por fim o personagem trará agora representatividade não só aos gays assumidos, como já faz o supracitado Estrela Polar, como também aos que ainda não tiveram essa oportunidade, mostrando que o mesmo Bob Drake hoje se sente mais à vontade de assumir sua sexualidade do que em 63. Isso sem dúvida mostra um avanço.
Agora é aguardar e ver o tratamento que esse acréscimo importante às HQs terá nas páginas das revistas (e até mesmo nos universos compartilhados do cinema). Será mais uma contribuição no intuito de corrigir o caráter “inocentemente” machista e excludente das HQs, ou vai ser “posto na geladeira” como muitas outras idéias – boas e ruins – que apareceram nesses últimos anos?
É esperar pra ver.