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Dark Wizard, o jogo que você (provavelmente) não conheceu

O auge da minha vida gameística aconteceu ali pelos meus 11, 12 anos, nos primeiros anos pós divórcio dos meus pais. Foi nessa toada que ganhamos (eu e meus irmãos) nuns Natais, nossos primeiros (e, em conjunto, únicos) videogames: a mãe nos deu um Master System Super Compact comedor de pilhas (um tempo depois meu tio fez uma gambiarra para ligá-lo na tomada), e o pai, um combo Mega Drive III com SEGA CD.

Era a riqueza total! Ou quase: cartucho era um troço caro e não tivemos mais nenhum jogo além dos que vinham com as caixas (Alex Kidd in Miracle World no Master; Ultimate MKIII, Sonic 1 e Altered Beast no Mega).

Melhores do Mundo - consoles

(Deus abençoe a todos os donos de locadoras de cartuchos. Que tenham vida longa e boa)

No Sega CD, o destino operou: ao que me consta, o console vinha sempre com dois jogos. Meu pai e madrasta compraram dois boxes Mega Drive + Sega CD: um para mim e meus irmãos e outro para os enteados do meu pai. Os dois combos vieram com o mesmo jogo mais ou menos (o simulador de voo “Tomcat Alley“, difícil pra caralho) e, no segundo, rolou a variação: o nosso trouxe o chatão “Microcosm” (basicamente um jogo de navinha dentro do corpo humano). Os enteados do meu pai deram mais sorte: além do Tomcat, veio no deles “Dark Wizard”.

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Dark Wizard era um jogo de estratégia de exércitos em turnos, e que como tinha magos, elfos, anões, guerreiros e coisa e tal, na minha pré-adolescência a gente chamava de “jogo de RPG”. A trama era a seguinte: Velonese, o mago das trevas, tava tentando dominar o mundo com seu exército de monstros e liberar o deus da escuridão, Arliman. Na verdade, quando o jogo começa ele já praticamente conseguiu atingir seu objetivo: seus generais (monstros ligados aos elementos – Aracna da terra, Acqua… da água, Sheena do ar e Karmak do fogo) já controlavam praticamente todos os reinos do mundo. Só sobrou o castelo de Quentin, praticamente no Alasca daquele mundo, de onde vem a resistência.

Vídeo de abertura do jogo

No percurso, Velonese (ou seus exércitos) tinham matado o rei de Cheshire (de algum jeito) e fodido com a vida de quatro pessoas: Amon, um vampiro que não quer dividir as trevas com ninguém; Krystal, uma feiticeira cuja irmã foi morta por um demônio e quer vingança; Robin, a amazona número um de Quentin; e Armer IX, o príncipe filho do último rei. Daí você escolhia um desses quatro pra encarar o vilão e seus exércitos. As animações de abertura são bem fodonas (e tinha uma parada que só agora, pesquisando para esse texto foi que descobri: a história do mundo difere conforme o personagem que você escolhe! O moleque que eu era bugava o céLebro com o rei morrendo, cada hora de um jeito, dependendo de quem você escolhia, e eu tentava amarrar tudo aquilo. Que burro! Isso porque em suas histórias, Krystal e Amon eram diretamente responsáveis pelo assassinato do rei, enquanto que nas tramas de Armer e Robin, o rei morre, sem mais detalhes). Nos vídeos abaixo tem as animações de apresentação de cada um dos personagens jogáveis.

A introdução dos personagens leais – Armer IX e Robin.
A apresentação de Krystal
E a apresentação de Amon, o vampiro demônio.

(Qndo eu era moleque nós tínhamos umas regras, e a principal delas é que ninguém podia jogar com o personagem do outro. Como o jogo não era meu, entrei na segunda rodada de escolhas – salvo engano tinha sobrado a Krystal e o Armer, eu escolhi o príncipe)

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Sim, eu tinha que jogar e acabei tomando gosto pelo playboyzinho da parada. Às vezes acontece.

O personagem que você escolhia para jogar implicava diretamente no tipo de exército que você podia formar. Como Krystal e Amon eram caóticos, seus exércitos eram de monstros maus e mortos vivos. Robin e Armer, tinham opções leais.

Pra arredondar ainda mais a coisa, cada personagem podia encontrar pela jornada dois outros personagens exclusivos de sua história: Armer podia recrutar Marie, uma maga, e Dianna, uma guerreira. Robin encontrava Kalil, um sacerdote e David, um guerreiro; Amon, Susan, uma feiticeira e o guerreiro Andrew; por fim, Krystal encontrava Marcus, guerreiro, e Katrina, uma sacerdotisa.

Isso sem contar as missões comuns a todos: recrutar os elementais para ter mais chances contra os generais de Velonese, ou aquelas coisas que hoje estamos habituados a chamar de “side quests”: achar a cidade dos ninjas, ser tratado direito na cidade dos elfos e essas coisas.

Aí cê tá lendo essas coisas todas e tá encaralhado de nunca ter ouvido falar desse jogo, já que (espero) minha descrição mais as animações devem ter te deixado babando.

Mas aí vinha a treta: você colocava o CD pra rodar, vinha a animação fodona de abertura, a trilha sonora arrebatadora (que na época da internet a gás ainda eu cacei jeito de baixar e ouço até hoje), você escolhia um personagem e vinha outra animação foderosa (cê já tava de pé em cima do sofá, pilhadaço), e… começava um jogão de tabuleiro digital.

Sério. Dá um bico nas imagens aí embaixo.

O jogo começava mesmo com um warlord do exército dos demônios te chamando de chato, bobo, feio, cara de melão e dizendo que ia tomar o último castelo de Cheshire – de 33 existentes no total. E aí você era jogado nesse tabuleirão. Seu exército (essas pecinhas alaranjadas da imagem, os exércitos demoníacos eram azuis) balançavam um bracinho, asa ou orelha, para indicar que ainda podiam realizar ações naquele turno. Aí você ia avançando as peças, uma a uma, em direção ao castelo inimigo, para tomá-lo. Até ali quase pelo meio do jogo, sua unidade mais forte é o personagem principal, mas à medida que os membros do seu exército vão evoluindo (os monstros), ganhando ofícios e conseguindo equipamentos (no caso dos humanóides) e coisa e tal, a parada vai ficando menos discrepante.

Um pouquinho do gameplay do jogo

Aí tem umas regrinhas gerais: 1) enquanto você mantiver o general num castelo, pode evocar criaturas (gastando poder mágico) ou contratar soldados humanóides (humanos, anões, elfos e hobbits), gastando dinheiro; 2) se alguma peça do exército inimigo se apossar do seu castelo base, se fo-deu: ou você terá de reconquistar aquele castelo ou, se tratando de Quentin, aí se fodeu grandão e o exército de Velonese tomou todo o mundo; 3) Se durante uma batalha seu herói morrer, se fodeu também (agora tô na dúvida se volta na fase anterior ou se dá game over. Acho que volta derrotado pro castelo anterior); 4) mesma coisa no contrário: se você matar o general inimigo e tomar o castelo, independente de quantas unidades ele ainda tiver no mapa, você termina a fase; 5) somente unidades humanoides poem entrar em cidades; 6) ah, as unidades do exército têm taxas de deslocamento diferentes dependendo do terreno e, em geral, sua força é inversamente proporcional ao quanto se deslocam (serpentes são lendas como lesmas tetraplégicas, mas aguentam dano para caralho. Unidades voadoras – lembro dos “rocs”, se deslocam muito, mas não aguentam um tapa. Uma exceção importante são meus amados centauros, que deslocam bem, atacam de longe e tiram – e aguentam – dano razoável).

Dito isso, vinha o segundo momento em que Dark Wizard recompensava a fé daquele que topou encarar a monotonia de grande parte do jogo: as batalhas!

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Uma batalha

O jogo tinha duas opções de batalha: em texto, meio Pokémon style (Fulano usou tal golpe. Foi efetivo. Tanto de dano, tomou contra-ataque – ou não – ganhou Y de experiência) ou animada, como na imagem acima. Nessa opção, você podia ver as peças se movendo, usando seus ataques especiais e coisa e tal. O problema é que o jogo ficava leeeeeento quando você escolhia essa opção, de modo que em geral a gente só usava isso quando encontrava alguma unidade nova, alguma evoluía pra algo que a gente não conhecia e queria ver como era. No normal, batalha de texto mesmo e só alegria.

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Olhando para trás, a mecânica de Dark Wizard, apesar de pouco atrativa, não chegava a ser novidade: lançado em 1988 no Japão (Dark Wizard é de 1993), Master of Monsters (do Mega Drive) já tinha um jeitão bem semelhante (pra não dizer “igualim-a-ponto-de-poder-considerar-Dark-Wizard-um-Master-of-Monsters-2“). Agora, se olhamos para o futuro, aí a coisa fica ainda melhor: hoje, em 2020, é fácil olhar para o gameplay de DW e não achar tão estranhão assim, já que jogos como Warcraft (1994) e Age of Empires (1997) deixaram esse tipo de jogo bem mais popular (e palatável).

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O primeiro Warcraft: muito, muito distante do que se tem hoje…

Mas a verdade é que Dark Wizard era igual aquela menina (ou rapaz) nem tão bonita com quem você namorou e foi feliz durante trocentos anos: a beleza nem é o que importa mesmo, o que vale é a história e a diversão.

E isso DW tinha de sobra: mesmo para os nossos paupérrimos conhecimentos de inglês, era uma história foda num jogo viciante.

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Naquela época não conseguíamos zerar o jogo. Tinha uma zica qualquer que nos impedia de encontrar o elemental da água, que tornava impossível vencer Karmak (o último general inimigo) e, sem isso, chegar até Velonese.

O tempo também passou e outros jogos ganharam mais espaço (lembra dos custos dos jogos? Some a isso o fato de que o Sega CD nunca foi um console popular e você se dará conta de que muito rapidamente ele perdeu espaço para o Mega-Drive E pro Master System na minha vida. A maior parte das minhas lembranças com ele se baseiam em… ouvir CDs de música).

Essa questão é importante: tem quem diga que o Sega CD não era sequer um console, mas apenas um acessório do Mega Drive. Mas, console ou acessório, a verdade é que o Sega CD não pegou. Não se popularizou e foi, na verdade, o começo da descida da ladeira para a SEGA: veio o Saturn, veio o Dreamcast e fim. Então, fica aí a reflexão: você conhece algum jogo memorável de Sega CD? Se tiver em mente que eu tive acesso direto a dois exemplares desse console, considerar que conheci apenas quatro jogos (também joguei Final Fight CD além dos que já citei), é pouco. Bem pouco.

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Pra se ter uma ideia do desprestígio do Sega CD na história, essas raspberry que são vendidas hoje em dia, em gabinetes imitando consoles antigos (já vi micro Snes, micro Atari) trazem jogos até de Game & Watch, um minigame da Nintendo de 1980 (e cujos jogos ficam bizarríssimos quando projetados numa tela HD de 49 polegadas).

Ou seja: além de não ter sido popular, o Sega CD ainda durou pouco e foi como um rio que passou na nossa vida.

Outra questão importante para que Dark Wizard fosse relegado ao limbo é o fato de ser um jogo nunca reeditado: ele não saiu em outros consoles, nem mesmo nos da própria SEGA. O Saturn, por exemplo, entrou no mercado japonês em 1994, um ano depois do lançamento de DW, e não o herdou. O próprio Masters of Monsters foi recuperado em 1998 para o Playstation e pro Saturn (não joguei. Mas a julgar pelas imagens, parece que foi um ganho e tanto).

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Depois de velho, já adulto, eu achei uma ROM por aí e fui jogar direto no emulador. Lembro de me divertir de noite em casa, madrugada a dentro depois do trabalho. Não lembro se zerei…

Claaaaaaro que escrevendo esse texto me deu uma puta vontade de rejogar DW. Como bom retrogame baseado em raspberry, meu fliperama não tem emulação de Sega CD (tem jogos do 32X e não tem do Sega CD ¬¬).

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Se você acha que é bonito ser feio…

Aí toca a caçar: Kega, as bios para jogos norte-americanos e europeus, e, por fim, a iso do jogo para então… PAU NA MÁQUINA! Isso tudo pra ver o jogo travar no encerramento da primeira fase. Lembrei que passei por isso quando joguei naquelas madrugadas – e não lembro como resolvi (se é que resolvi). Caço outras bios, troco, jogo de novo, trava de novo. Troco a iso, troco o emulador e… nada. Em 12h, numa média de 80min por vez, fiz a primeira fase TRÊS VEZES sem resultado.

Frustrado, tentei jogar o Master of Monsters (que tem na raspberry). Não dá, Dark Wizard, apesar de ter exatamente a mesma mecânica, traz atualizações interessantíssimas ao jogo (principalmente com a história e nostalgia).

Um dia tento de novo, afinal, o mal não dorme nem envelhece!

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