A gente vimos: Power Rangers (2017), por Algures
Eu não posso me considerar um fã de Power Rangers. Mas assisti o suficiente da série original pra lembrar dos personagens principais, dos zords e da musiquinha da flauta do Ranger Verde quando ele invocava seu zord.
Para crianças, a série funcionava tão bem quanto aqueles desenhos antigos como Capitão Planeta, As Tartarugas Ninja e Transformers. E, assim como estes desenhos, é um programa que não resiste à passagem do tempo a não ser pelos olhos da nostalgia infantil. Diferente dos desenhos citados, no entanto, Power Rangers ainda é uma franquia muito viva e que se mantém ativa graças as novas gerações de crianças por aí.
Power Rangers, o filme (não aquele “o filme”, o filme mais recente) não é para as crianças de hoje, embora eu pense que elas se beneficiariam muito em ver esse filme. É uma história sobre adolescentes tentando reagir a um mundo que não entendem ou que parece estar sempre contra eles. Ou ambos.
Na história, Jason, Billy, Kimberly, Zack e Trini são jovens que estudam na escola de Alameda dos Anjos e que, em outras circunstâncias, nunca seriam amigos. Jason, inicialmente famoso por um futuro como jogador de futebol americano, ganha fama negativa ao fazer uma estupidez com os amigos e resolver tomar a culpa para si; Billy, diagnosticado dentro do espectro autista, não têm amigos; Kimberly, que fazia parte do grupo de garotas populares, cai no ostracismo por uma brincadeira que vai longe demais; Zack, que cuida da mãe doente, não consegue se conectar com nada nem com ninguém; e Trini, uma jovem com dificuldades em relação a sua própria identidade, não consegue confiar em ninguém. Quando os 5 acabam indo parar em um local proibido por acaso (ou destino), encontram uma espaçonave enterrada desde a extinção dos dinossauros, habitada por Alpha 5 e Zordon, que revelam aos jovens que eles foram escolhidos para serem os próximos Power Rangers e impedir Rita Repulsa de encontrar o Cristal Zeo e destruir a vida na Terra.
Como toda história de origem, Power Rangers passa a maior parte do tempo introduzindo o universo, revelando os personagens e apresentando os jovens em treinamento. Eles só se tornam Rangers mesmo lá pelos últimos 20 minutos de filme. Para a sorte do espectador, os personagens são interessantes e os atores carismáticos, o que faz você querer acompanhar a jornada deles ao invés de apenas ficar esperando a hora de morfar. Ponto para Dean Israelite, o diretor, que já havia mostrado com Projeto Almanaque que consegue pegar uma história clichê e transformar num filme interessante com personagens cativantes.
Apesar do ritmo adequado, a demora em mostrar os personagens se tornando Power Rangers pode ser frustrante para alguns. Mas foi um mal necessário para garantir o engajamento necessário daqueles que não estavam ali apenas pela nostalgia, e sim por um bom entretenimento na sala de cinema. A história começa lenta e vai acelerando até o seu climax, e o mesmo vale para o nível de “seriedade” da história. Começamos com um drama adolescente que vai transitando aos poucos para uma história mais fantástica e com menos amarras realistas – incluindo até homenagens diretas, como o uso do tema clássico da série e a formação de batalha dos zords)
Para quem lembra o suficiente da séries, Power Rangers pode parecer bem diferente, mas apenas na estética. No fundo, o filme continua usando a fantasia para falar de temas como a consolidação da amizade, o conflito tentações da adolescência X responsabilidade e a transição para a vida adulta, temas relativamente rasos na série, mas que são bem explorados no filme. Para quem nunca foi muito fã, esta atualização tem diversos méritos, como dar sentido a diversos dos elementos da série (como o formato “dinossauro” dos zords e o Megazord) – ao menos o suficiente para a suspensão de descrença.
É claro que, como qualquer blockbuster, o filme não vem sem seus problemas. Enquanto os jovens atores se esforçam para fazer seus personagens parecerem pessoas reais, Elizabeth Banks abraça a “bobisse” da série original, o que por vezes destoa bastante do resto do filme – especialmente se considerarmos que sua introdução inicial é mais inspirada pelo horror pg-13 de hoje em dia do que pela leveza infantil dos programas de outrora.
Além disso, o momento em que os zords se unem para formar o megazord, apesar de ser uma cena legal, não explica claramente o que aconteceu e de fato o porquê da junção, a não ser pela “força da amizade”. Ainda sobre os Zords, nem todos os visuais funcionam: com exceção do tiranossauro e do pterodáctilo, nenhum dos outros parece lembrar os animais que eles deveriam representar.
E, sobre a “força da amizade”, vale citar também como ponto negativo, embora não incomode: apesar de parecer uma ficção científica, Power Rangers traz aqueles elementos “pseudomísticos” da série, como o fato das moedas rangers “escolher” as melhores pessoas, por exemplo (a velha tática do coisas-que-acontecem-por-acaso-mas-que-na-verdade-é-o-grande-plano-do-universo).
No fim das contas, só dá para avaliar um filme por quanto você se engajou na história e o quão satisfeito você sai da sala de cinema. Power Rangers foi muito bem sucedido neste caso, ao menos para mim. Uma boa revitalização dos conceitos clássicos que mostra que é possível modernizar uma coisa considerada “muito boba” ou “datada” sem descaracterizar a essência dos personagens como outros filmes de super-herói já fizeram.
Nota: 7,59