Damasceno e Garrocho, o Lipão, chegam para ocupar um espaço há muito relegado no mercado de quadrinhos no Brasil. E já adianto: ocupam MUITO bem!
Em Cosmonauta Cosmo! (CC! na economia do teclado) somos apresentados ao pequeno Cosmo Nauta Nemo Segundo, um garotinho imaginativo por volta dos ahn… três, quatro anos de idade. Cosmo quer um amigo como o cãozinho da Tv, para fazer companhia, acrobacias e pular anéis de fogo, tudo o que uma criança normal deseja da vida. Mas animais são proibidos no prédio em que ele vive, de modo que ele se vê obrigado a fazer o que qualquer criança faria: montar em sua nave espacial e procurar um amiguinho em outro planeta, já que a proibição não se estende a alienígenas!
A trama segue Cosmo em suas aventuras, planeta a planeta, conhecendo “gente” nova e suas histórias – sempre em busca de alguém para trazer consigo. Nesse ponto, segue um tanto a mecânica de outras produções culturais consagradas, como O Pequeno Príncipe (pra mim a principal delas) e Avatar (o desenho, não a Pocahontas azul do Cameron): diferentes lugares, diferentes pessoas, diferentes lições. Mas não pense que o resultado cheira a papel carbono, muito pelo contrário: Damasceno e Garrocho dão um frescor especial à proposta, porque fazem de Cosmo um garoto genuíno: ele é inconsequente, obstinado e franco. É uma trama simples, com direito a lição no fim (sem ser moralista – é uma lição humanista – ou moral no sentido amplo) e linguagem adequada. Isso tudo sem ser pueril ou ofender a inteligência do leitor. É uma história boa, contada de uma forma leve, pronta para consumo imediato – e sem qualquer contra-indicação!
Se CC! tem problemas, eles certamente para mim estão exclusivamente no formato e não no conteúdo. Claro, não faço ideia de quem toma esse tipo de decisão (e deve ter dados sólidos pra isso), mas acho a publicação de CC! em formato álbum um tanto equivocada. Veja bem: é óbvio que há público consumidor para um material infantil de preço considerável como Cosmonauta Cosmo!. O formato álbum define isso, porque define inclusive onde o material será vendido, onde fica disponível (no caso, as livrarias). Mas a estrutura narrativa, o conteúdo de CC!, ao meu ver, o tornam um material possível para um outro espaço: auto-contidos, cada um dos seus cinco capítulos poderia ser publicado independentemente, com um valor unitário bem mais baixo. Sim, eu sei que o mercado de banca é um lance difícil, mas lendo a HQ “viajei” numa publicação em pequenos encartes de jornal semanal, para somente no final sair em edição completa. Isso tudo porque eu não consigo evitar de pensar em CC! como uma HQ perfeita para retomar aquele tempo de antigamente, quando você, moleque catarrento, ia com a sua mãe (ou seu Ultra) na feirinha de sábado e ganhava um gibi baratinho pra não incomodar durante as compras. Perdi as contas de quantos gibis de aventura eu li assim – gibis com essa exata pegada de Cosmonauta Cosmo!
Até porque há um bom tempo que, no Brasil, não há salvação para os quadrinhos infantis fora do reino do Maurício de Sousa. Quadrinhos infantis de aventura e fantasia então, nem no Reino do Castelo do Dragão. Iniciativas pontuais aqui e ali até dão as caras, mas são bem poucas e esparsas. Sim, só o futuro dirá se Cosmonauta Cosmo! será mais uma dessas iniciativas perdidas, mas o que se vê nesse momento é que, qualidade para perdurar o material tem.
Num resumo, Cosmonauta Cosmo! é um excelente gibi infantil. Não, não vai te fazer delirar, nerd-seboso-eternamente-pós-adolescente, mas também não vai te ofender a inteligência (nem das crianças). Vale muito, muito a pena mesmo. Só acho que podia ter sido publicado num formato mais acessível: porque dá dó de entregar esse material bonitão (e caro sim!) pra ser naturalmente destruído por uma criancinha sonhadora….
Cosmonauta Cosmo!, de Eduardo Damasceno e Luís Felipe Garrocho. Editora Miguilim (Selo Miguilim). 112 páginas, R$49,90
Nota: 9,5