A gente lemos: Astronauta – Singularidade, por Poderoso Porco

Há pouco mais de dois anos, pra ser mais preciso em novembro de 2012, o trio de chégas Sidney Gusman, Danilo Beyruth e Cris Peter iniciavam um projeto que sim e sem exageros, balançaria as estruturas do carnaval, digo, do cenário nacional de quadrinhos. O projeto, as Graphics MSP, e seu primogênito, Astronauta: Magnetar.

De lá pra cá, com considerável influencia das próprias graphics, o cenário mudou. Artistas praticamente desconhecidos do grande público se firmaram, e outros, razoavelmente conhecidos, se tornaram super stars.

Tudo graças a um astronauta preso na solidão gélida do espaço.

Se Magnetar iniciou uma bem sucedida e badalada série de quadrinhos, se converteu a arte do Danilo em estatueta (Que ainda pode ser adquirida aqui. Mas teve MdM que já comprou) então… por que não dar continuidade ao sucesso? Oras, que se dê! É quando surge Astronauta – Singularidade, segunda graphic estrelada pelo personagem mantendo a mesma equipe de artistas.

A de Singularidade trama começa exatamente nas consequências dos acontecimentos vistos em Magnetar. Astronauta Pereira, o Astronauta, precisa ser avaliado para saber se tem condições psicológicas para voltar ao espaço, após os eventos traumáticos da HQ anterior. É aí que entra a psicóloga responsável por avaliá-lo, a Doutora (isso mesmo. De repente ela veio de Gallifrey, sei lá. Não, não, eu sei que o nome dela é assim pra manter o estilo da série Astronauta, ok?). Entretanto, uma missão conjunta com outro país obriga o Astronauta a voltar ao espaço, talvez antes de estar plenamente recuperado, de forma que a Doutora precisa acompanhá-lo. Não só ela, como o misterioso Major, astronauta enviado pelo país colaborador para participar da missão. Sim, se o grande problema em Magnetar era solidão, aqui, com certeza a zica é o excesso de contingente!

O trio então se desloca para a missão, cujo objetivo é estudar um buraco negro e suas implicações. Mas claro, nem tudo são flores e algo de errado precisa (e vai) acontecer.

Não foram poucos os méritos de Danilo Beyruth com seu trabalho no primeiro volume de Astronauta: na ocasião, o homem por trás de Bando de Dois e Necronauta contou uma história simples, mas bem amarrada, sobre a solidão extrema e seus malefícios. Se não era um tema completamente novo na indústria cultural, era sim muito fresco e inesperado nos quadrinhos, sobretudo num personagem do Mauricio de Sousa – ainda mais com toda a profundidade e competência com que a história foi contada.

Aí que tá o problema.

A comparação não favorece nem um pouco o novo trabalho, Singularidade. Se em Magnetar a decolagem afasta o personagem do solo conhecido das tramas da MSP, em Singularidade a nave vem pousar no solo também muito conhecido, com seus clichês e lugares-comum, do quadrinho de aventura. Assim, saem de campo as boas sacadas (como a espacialização radical do tempo) e entram alguns clichês: a donzela em perigo, o vilão vestindo roupas escuras e óbvio desde sua primeira aparição… Isso faz da história uma HQ morna. Não é boa o suficiente para figurar numa lista de melhores do ano, nem é ruim para ser ignorada. É só média mesmo. Entretanto, cabe sim um puxão de orelha: pô Danilão, em pleno 2014 e você me coloca uma mulher na história que não serve pra nada? Pô, a única função da Doutora na trama é correr perigo e servir de motivação pra revolta do herói! Não dava pra ter dado a ela um espacinho maior não, alguma atividade e dignidade?

Sei que soa chapa-branquisse dizer isso, mas é preciso destacar que se trata de um álbum arroz com feijão. Um arroz com feijão muito bem feito, mas ainda assim… arroz com feijão – e o cozinheiro sabe fazer muito bem outras coisas. Claro, talvez ele sirva para estabelecer as bases dessa nova encarnação do personagem, bases bem fincadas no quadrinho de aventura, quase como um módulo de exploração espacial: é preciso primeiro construir o básico e essencial, para depois se lançar em aventuras radicalmente novas – disso vamos saber em eventuais Astronauta’s 3, 4, 5, ao infinito e além, 1278, 1279

Agora, é preciso citar um ponto em que Singularidade é superior a Magnetar, e esse ponto são as cores da Cris Peter. Não, nada mudou, continuamos falando da mesma indicada ao prêmio Eisner em 2012. Entretanto, aqui ela definitivamente pegou o jeito do universo do Astronauta e do traço do Beyruth. Continuam os fundos monocromáticos e meio pastéis do Mauricio de Sousa style guide, mas alguns tons que soavam (pra mim) muito sintéticos em Magnetar saíram definitivamente de campo. É o espaço sideral, são naves e equipamentos, mas as cores estão muito mais orgânicas e agradáveis. Ponto pra Cris!

Astronauta – Singularidade, de Danilo Beyruth (coleção Graphic MSP). Editora Panini, 80 páginas, dezembro de 2014. R$ 29,90 (capa dura) R$19,90 (capa cartonada).

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Nota: 6,446
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