Nos últimos meses, no meio da correria de preparação para o 12º FIQ-BH, vi dois assuntos dominarem a gibisfera brasileira: 1) a tal “amazondependência” (direitos reservados pelo zé lá no Cartório da Internet); 2) o retorno do regresso do formatinho como forma para recuperar a popularidade decadente das publicações de quadrinhos.
O primeiro assunto não me interessa, pelo menos não agora. Tenho coisas a dizer sobre? Acho que sim. Mas no momento não quero não (nem sei se vou querer).
Então, o lance agora é o trem dos formatinhos. Pra ter uma visão geral, acho que o vídeo do Fora do Plástico sobre o assunto dá uma boa noção:
Em resumo, a parada é: ecoando uma decisão da DC nos EUA (a Compact Comics: pelo vídeo, grandes histórias, “clássicos” em formato de bolso); uma reflexão da Panini Espanha (que detém os direitos da Marvel lá na terra das touradas); e uma estratégia da francesa Glénat (a Glénat BD poches, literalmente, “quadrinhos de bolso Glénat”), a Panini Brasil também promete uma linha de formatinhos, a DC Pocket. E, pra começar, nada menos do que a pérola irretocável de Mark Waid e Alex Ross Reino do Amanhã.
No caso de Reino do Amanhã, a edição DC Pocket vai contar com capa cartão, formato 14,5×21,7 cm, 216 páginas e preço de capa de R$49,90.
E pra quê isso?
Os motivos declarados são os de sempre: público consumidor diminuindo, valor unitário das publicações subindo, os mangás dominando completamente o gosto da galera mais jovem. Portanto, esses formatinhos new generation têm o objetivo de serem um produto mais popular, acessível, atraente para um novo público e que, literalmente, caiba no bolso.
Mas será que o problema tá no formato? Os mangás são mais atraentes mundo afora porque são publicados em formato 15,3x21cm? (tô usando um tanko da New Pop como referência)
Claro que não. Eu e você somos adultos e contamos com nossos cérebros íntegros o suficiente para percebermos que isso não faz o menor sentido.
Tampouco é uma questão de preço. Pelo menos não no Brasil: se tomarmos como parâmetro um mangá popular como Chainsaw Man (13,5x20cm, 184pág., R$39,90), o preço equivale a quase 3% do salário mínimo (que caso você seja como eu e esteja meio alienado disso, no momento em que escrevo é de R$ 1.412,00). Se compararmos com um gibi ordinário de supers (o popular gibi de hominho) o que vamos ter é o seguinte:
(ah, e antes que você dê xilique pela referência ao SM… Olha, a gente precisa de uma referência pra ter noção das dimensões de alguma coisa. Eu podia usar, sei lá, o preço do Big Mac como padrão, mas ninguém vive de Big Mac. Quer dizer, algumas pessoas morrem disso, mas é outra história)
Pra gente ter algumas balizas, vamos usar outro valor de referência além do percentual do salário mínimo. Façamos um cálculo de valor por página (v/p) (sei que é tosco e talvez até pouco funcional. Mas ele vai servir pra gente ter uma ideia do volume de “entretenimento” potencial que você está comprando a partir de um valor aproximado): Chainsaw Man 0,21v/p, ou seja, cada página do mangá custa 21 centavos.
No caso do gibi mensal, o trem não fica bonito: 0,34v/p é o preço por página em Mulher-Maravilha & Flash.
A questão é que, apesar de custar mais por página, um gibi de supers custa relativamente menos no todo (já que você não é o Celso Russomano pra chegar na banca e dizer que quer comprar só 12 páginas de gibi hoje).
Claro, isso é uma conta de padaria e não deve ser encarada assim a seco: Chainsaw Man, como grande parte dos mangás, é em preto e branco, o que provavelmente representa um fator de economia em comparação com uma mensal de supers, toda em cores. Para se ter uma ideia, se tivesse as mesmas 184 páginas de Chainsaw Man, Mulher-Maravilha & Flash custaria quase sessenta e três reais.
Aí você me pergunta: “Uai, Lucazed., então o formatinho é o lance mesmo! Aí, óh! Os números mostram!”, calma Cocada, calma. Porque nesses nossos números tosquinhos aqui, a gente precisa considerar que é preciso baixar o valor por página. Se reduzir o formato for suficiente para diminuir o preço, ainda temos de pensar se isso é o bastante para popularizar o produto.
Mas minha perspectiva aqui é outra, a questão que me interessa é um outro lado dessa parada: mexer no formato e no preço é o suficiente para salvar o quadrinho de super-heróis no Brasil?
A resposta curta é NÃO. Quer dizer, eu penso que não.
E a resposta longa… bem, a resposta longa é o resto deste texto.
Pra começar, vamos falar de cascalho, tutu, bufunfa.
Mas antes disso, vou colocar aqui [mais] uma tabelinha jacu pra gente ter uma noção contextual durante a conversa:
Primeira coisa, perceba que aquela relação que a gente toma como óbvia, isto é, de que quantidade de páginas e preço são diretamente ligados, não é tão significativa quanto a gente pensa: bora de novo com o v/p: Chainsaw Man está na média (0,21v/p) em relação à maioria dos demais (DC Pocket 0,23v/p; DC Kids 0,19v/p; e Marvel Dose Dupla 0,24v/p), que têm uma variação em relação a ela menor do que o desvio padrão (DP = 0,05). Por outro lado, das duas publicações com as relações mais “extremas” — DC Teens (R$0,13v/p) e Marvel Teens (R$0,30v/p) — é Marvel Teens que está mais fora da casinha (sua diferença em relação à média [0,09], é muito superior ao DP, maior até do que a DC Teens [0,08] — mas isso já é sabido: rolou um grito da galera quando essa edição aí foi lançada. Os demais valores, mesmo com as variações de número de páginas e preço, estão ali dentro de uma faixa normal. E mais interessante (talvez), que é a importância do cálculo relativo: aquela com o menor número de páginas [Marvel Dose Dupla] não é muito mais barata na relação v/p do que as demais, mas seu valor percentual relativo ao SM, esse sim é o menor (menos da metade dos demais).
(pelo amor de Kirby, não me peçam pra ir além disso em termos estatísticos. Entreguei tudo o que tinha sobre o assunto no meu célebro, e nem duvido que possa ter derrapado em alguma coisinha. Sintam-se à vontade pra corrigir, complementar, enfim)
Apesar disso, sei que esses números não acrescentam muita coisa assim, desse jeito. Quer dizer, permitem uma conclusão sim: se a questão fosse formato, ou vá lá, formato E preço, boas HQs em formatinho e preço ok como DC Teens: Superman esmaga a Klan ou Marvel Dose Dupla deveriam vender bem, talvez até tão bem quanto a publicação paradigmática da nossa brincadeira, que é Chainsaw Man.
Mas ninguém aqui é mentiroso, iludido, desonesto ou bocó o suficiente pra dizer que é isso que acontece.
Também precisamos reconhecer que o que fizemos até aqui passa longe de ser o que as pessoas têm em mente quando pensam no formatinho como o Sassá Mutema das vendas de quadrinhos (sim, a referência velha é pra combinar com o tema). Porque o que elas pensam mesmo é:
Bom mesmo era no tempo da Abril!
Para essa parte do texto, eu fiz uma coleta aleatória aqui na Suína Tower dos primeiros formatinhos de cada tipo que encontrei.
Sim, de cada tipo.
Porque muita gente não sabe, ou esquece, ou finge que não viu, mas no tempo da Abril formatinho não era tudo igual não, senhor!
Sem contar variações nos números de páginas, acabamentos (tipo lombada grampeada ou quadrada) ou edições especiais, a Abril teve pelo menos dois tamanhos diferentes de formatinhos: 13,5×20,5cm (1975–1980), 13,5x19cm (1980–1997) e depois 13,5×20,5cm outra vez (1997–2002). Parece bobagem, mas atrapalha bem na hora de organizar, principalmente títulos em que o tamanho mudou no meio da série.
Na verdade, parece bobagem e é. Fica de curiosidade pros xóvens.
Para a nossa brincadeira gostosa aqui, vou considerar apenas a última edição de cada formato já dentro do plano Real (logo, desconsiderando a primeira fase de formatinhos compridos ou os famigerados “consulte o jornaleiro”).
Como a gente tá brincando — a sério, mas brincando — cabe a brincadeirinha de compararmos o v/p dos gibizinhos do tempo da Abril, e a coisa fica assim: R$0,02 v/p (Superboy 2ª Série) e R$0,04v/p (Liga da Justiça série Planeta DC). Quando a gente compara com os formatinhos Panini, DC Teens foi o título que mais se aproximou, mesmo assim ficando bem distante: estamos falando de R$0,13v/p!
Ou seja, primeira constatação: sim, o quadrinho ordinário de super-heróis aumentou muito!
Pra você não ter que ficar rolando a página pra cima e pra baixo, bora juntar tudo em mais uma tabelinha troncha, agora usando o “campeão” da categoria dos formatinhos Panini e a última encarnação daqueles da Abril:
Marquei aí em verde aqueles que alcançaram os melhores índices e, em vermelho, os piores (e repara também que eu acrescentei uma linha com o v/p).
Então, pra começar (e isso já estava exposto no texto): o valor unitário proporcional e o valor por página não coincidem. A publicação proporcionalmente mais barata não é aquela com menor valor por página.
De novo: como você não é o Celso Russomano, cê não vai chegar na banca do Seu Joaquim e pedir doze páginas de Mulher-Maravilha embaladas para viagem. Então, o que importa mesmo é você saber o impacto que um gibi causa no seu orçamento mensal.
Nesse sentido, a nova novidade da Panini… começa mal. Ainda que o preço por página se aproxime do mesmo índice para o mangá, o preço relativo é consideravelmente mais alto.
Em contrapartida, o formato de Dose Dupla é a que reúne as melhores condições materiais para fazer frente aos mangás — inclusive porque é a publicação que mais se aproxima dos números do final da fase Abril (que vamo lá, né, FINAL DA FASE ABRIL. Não era esse mar de rosas que muito velhão por aí que quer fazer parecer)
Aí chega a questão que eu rodeei, rodeei e rodeei pra chegar (sim, tô aqui digitando vários numerozinhos mas o ponto que eu queria abordar mesmo passa longe disso. Mal aí)
Porque tem umas perguntas que precisamos fazer para chegarmos mais perto de entender — na minha humilde e correta opinião — o porque os quadrinhos de super-heróis estão em baixa e os mangás são o novo paradigma de entretenimento popular em forma de quadrinhos.
Pergunta 1: Aproximar as publicações de super-heróis dos mangás, em termos formais, pode funcionar para alavancar as vendas de comics de supers?
Pergunta 2: Por que os quadrinhos de super-heróis andam vendendo pouco?
Pergunta 3: Por que mangás vendem mais do que quadrinhos de super-heróis?
Como acho que você deve ter percebido com tudo o que leu até aqui, no meu entendimento, aproximar o formato dos quadrinhos de supers dos mangás não é o suficiente para pegar carona no sucesso dos produtos japoneses.
Primeiro, porque isso me parece muito jacu, algo que a gente poderia chamar de “estratégia Ratatoing” (ou estratégia Vídeo Brinquedo, ou Polystation, enfim, acho que cê já entendeu): achar que as pessoas vão comprar uma coisa simplesmente porque ela se parece com algo que elas já compram. Como se quadrinho ainda fosse uma coisa que sua mãe, seu pai, sua avó ou outro parente adulto que não manja nada daquilo compra pra você na saída do trabalho.
Quem frequenta banca de jornal, livraria ou sebo já viu essa cena: entra um adulto que não manja nada sobre quadrinho. Se ele já não traz o nome e os números daquilo que o filho ou filha, neto/a, sobrinha/a, enfim pediu para comprar. E, se não traz isso consigo, bem… esse adulto traz um smartphone, com o qual manda uma mensagem ou liga (até de vídeo!) para comprar exatamente o que deve ser comprado.
Pra mim, a primeira pergunta tem como resposta um belo não, nem fod…
Pergunta 2: Por que os quadrinhos de super-heróis andam vendendo pouco?
O primeiro aspecto óbvio é: histórias em quadrinhos eram um ótimo entretenimento, barato e popular quando… não tínhamos muitas formas de entretenimento baratos.
Se você, como eu, já tá nos -enta (quarenta, cinquenta…), vai se lembrar que até ali pela primeira década de 2000, ainda existiam coisas que todos nós fazíamos: quando Cavaleiros do Zodíaco estreou na Manchete, todos os nossos amigos e colegas de escola, incluindo nós mesmos, assistíamos ao desenho. No dia seguinte de um filme nerd na Sessão da Tarde, esse seria o assunto na escola. Todo mundo via os mesmos filmes, brincava com os mesmos brinquedos e brincadeiras, assistia os mesmos desenhos no Xow da Xuxa.
Acontece que em 2024 as opções de entretenimento são inúmeras — e não só porque existem opções que antes não existiam, tipo o streamming — mas também porque dentro dessas novas opções há dezenas de centenas de novas opções: qual é a chance de você chegar um dia no trabalho e todo mundo ter assistido a mesma coisa no dia anterior?
Mesmo que todos nós façamos mais ou menos as mesmas coisas (chegar em casa, sentar no sofá e entrar na Netflix), se não estiver algo muito bombado rolando, muito provavelmente cada um de nós verá algo diferente.
E isso porque eu limitei à Netflix. Porque pode ser que o Fred, meu parceiro de baia no serviço, chegue em casa e vá assistir UFC no pay-per-view, o Dr. Rafael vá jogar videogame enquanto a Cynthia joga boardgame com o marido, meu chefe vê Barbie com a filha, eu leio quadrinhos no escritório e Dona Flávia maratona Manifest: O Mistério do Voo 828…
Então, meu amigo… as opções de entretenimento explodiram. A preços os mais diversos, alguns bem acessíveis — por menos de 50 reais, você tem o catálogo imenso da Netflix à sua disposição. Pagando um plano de internet bom, você pode gastar todo o seu tempo de folga no Youtube, sem assistir dois vídeos que sejam do mesmo canal.
Como entretenimento barato, os quadrinhos foram atropelados. Há opções mais baratas, mais atrativas, mais versáteis e mais coerentes com o mundo de hoje.
Pra piorar, tem uma coisa que vejo aparecer pouco nessas discussões, e que é uma tecla na qual eu bato há anos: onde se compra quadrinhos?
Sim, porque pensa aí: antigamente tinha uma banca de revista em cada esquina, e nossos adultos passavam por lá rotineiramente. Minha família sempre comprava o Estado de Minas (o jornal) de domingo, e de lambuja me sobrava um gibi da Turma da Mônica ou da Liga da Justiça.
As bancas de jornal agonizam em estado terminal. Os próprios jornais impressos estão morrendo.
O próprio o Dose Dupla que citei acima: era ótimo, capa mole, lombada com grampos, preço legal…
O problema era achar. Não chegava em lugar nenhum, não existe mais ponto de venda ocasional “pro office boy que quer ler algo no ônibus”, não tinha divulgação (como que o leitor potencial, que não frequenta o que sobrou de banca ou o site da Panini, vai saber que o trem existe?) e aí o título foi pro saco. Seis edições em TRÊS ANOS.
Até uns 15/20 anos atrás, a distribuição de quadrinhos tinha uma capilaridade física que não existe mais, mas seu contrário exato: hoje vivemos centralizações. A imensa maioria dos nossos quadrinhos são comprados na internet (e lá naquela mesma plataforma de e-commerce) ou em eventos.
Esse modelo (exceto pelo lance dos eventos) favorece que a gente compre sempre a mesma coisa — porque eu já entro na Amazon sabendo o que eu quero comprar — e prejudica que eu descubra algo novo, como acontecia quando frequentávamos as bancas de jornal. Cê saia de casa pra comprar sua edição mensal de X-men e topava com um título novo e inesperado.
Aí cê me diz “Mas Porco, posso até concordar com você, mas então o que que o mangá tem que ele tá se segurando? E, com isso, como se você não fosse mais do que uma projeção da minha própria cabeça, se abre a oportunidade de abordar a minha terceira pergunta:
Pergunta 3: Por que mangás vendem mais do que quadrinhos de super-heróis?
Resposta sincera? Não sei. Se soubesse tava nos EUA ou Nazoropa vendendo solução pras Marvel/DC, Glénat da vida.
Mas tenho meus palpites.
Um deles é quanto à linguagem. Eu vejo meus sobrinhos, os filhos dos meus amigos mais próximos, enfim, uma molecada que tá ali entre os 13 e 20 anos de idade: eles têm acesso à minha biblioteca com quase cinco mil títulos, a custo zero, podem escolher praticamente qualquer coisa para ler e, quando vêm aqui em casa, é na prateleira dos mangás que eles se interessam ou, vá lá, as meninas vão para as prateleiras de independentes.
Ninguém parece ligar para os gibis de super-heróis.
Talvez seja um gênero que eles acham cafona, que não fala com eles, que não tem o ritmo (no sentido de cadência) que eles gostam.
Isso pra mim, tá meio que no imponderável e que precisaria ser pesquisado para entendermos melhor. E pesquisado além da velha repetição das pesquisas “de opinião” (“jovens preferem comics ou mangás”, “dos quadrinhos que você compra ao ano, quantos são mangás e quantos são de super-heróis” e coisas desse tipo).
Outro, é que parece que o mangá é o que ainda tem chegado mais próximo daquele sentido de comunidade que eu falava lá atrás: nossos sobrinhos de idade mais próxima (Duda 16a., Murilo 14a., Manu 12a. e Théo 8a.), leram, assistiram, falavam e brincavam de Naruto ao mesmo tempo. Num final de semana num sítio, a enteada de uma colega e o filho de outra, que nunca tinham se visto, bateram um papo danado sobre Demon Slayer.
Tal qual o caso anterior, eu não sei explicar o que gera isso. Talvez os mangás serem multimodais de maneira coerente — a história que tá rolando no anime tem sentido com a história que tá rolando no mangá — sem ter que fazer um curso de extensão pra conseguir entender o que tá acontecendo quando muda de uma plataforma pra outra.
O quadrinho de super-heróis (e o fã-clube, cê tá ligado. Até mais o fã-clube) é muito pouco convidativo aos não iniciados.
Imagine que um desses moleques topou com X-men’97 passando na Tv. Ok, considere que já tem o problema do desenho animado ser a continuidade de uma série de trinta anos atrás, mas vá lá, não é um trem muito complexo e o moleque se engajou.
Mas a temporada acabou e ele quer seguir curtindo os personagens.
Não preciso falar mais nada, né? Vai encontrar um universo que só muito sutilmente tem relações com o que ele acabou de assistir!
A gente precisa ser honesto com a gente mesmo, e reconhecer que os quadrinhos de super-heróis são escritos para mim e pra você, velhos dos enta. Gente que lê esse negócio há vinte, trinta anos. E que, lendo os mesmos personagens há 20, 30 anos, somos nós que exigimos cada vez mais novidades, e novidades mais “disruptivas”, que afastam os novatos mas que nos mantém fidelizados.
O banho que os mangás dão nos supers nesse sentido é mítico. Enquanto um mangá longevo — como One Piece, em publicação há 27 anos — conta uma mesma e longa história, um personagem como o Superman tá aí há mais de 80 anos, não vivendo uma história única, mas uma multiplicidade de histórias confusas, que se encaixam sem se encaixar, que continuam umas às outras sem efetivamente continuar.
Repetindo as majors norte-americanas, a Panini diz “precisamos atingir novos públicos”, mas insiste em práticas que, no frigir dos ovos, continuam chegando sempre e só na mesma moçada 30+.
Logo, as iniciativas parecem ser pensadas só pra esse público já cativado, um público que, por questões lógicas, está diminuindo com o passar dos anos, não aumentando — morrendo, abandonando o hobbie, assumindo outras prioridades na vida, enfim.
Do outro lado, propostas que poderiam atingir um público novo (como o Dose Dupla) não conseguem chegar lá, porque a dinâmica de distribuição não existe, os espaços físicos de contato com o novo minguam…
Para termos resultados, é preciso pensar além do óbvio, do rasteiro, da perfumaria: o buraco é bem mais embaixo (e maior). E não essas saídas que têm alcance restrito mesmo dentro desse grupo já restrito dos fidelizados (quem vai comprar Reino do Amanhã pela centésima vez?).
E isso até daqui a seis meses, quando vão reinventar a roda outra vez (sim, a redundância é intencional); ou a alguma campanha jacu como a Mythos vive fazendo, pedindo para as pessoas comprarem duas edições de um gibi que vai mal das pernas para presentear alguém.
Bem, acho bem possível que esse texto tenha aberto mais portas do que fechado, e talvez ido para lados muito diversos (se pá até um pouco confusos).
Mal aí por isso.
Na pior das hipóteses, tome esse texto com um conjunto de reflexões mais ou menos estruturadas, que podem (ou não) serem melhor desenvolvidas no futuro.
Enfim. Vida que segue.