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A gente vimos: Mr. Holmes

Tem umas coisas que são difíceis de entender: o sentido da vida, do universo e de tudo mais, Lost, e porque alguns filmes, com premissas e elencos fortes, são lançados aqui na República das Bananas direto em DVD.

É o caso de Mr. Holmes, com o maioral Sir Ian McKellen. Lançado no Reino Unido no meio do ano passado, o filme acaba de chegar aqui nas nossas videolocadoras (caralho, acho que entrei na máquina do tempo escrevendo isso).

Na época em que foi anunciado – McKellen como um Holmes velhão – eu fiquei bem empolgado pra ver. Mas o tempo passou e Mr. Holmes entrou na seleta imensa lista de filmes para os quais cagamos aqui do MdM, até que agora nas férias rolou o acaso de vê-lo. E não me arrependi.

Em Mr. Holmes, como é evidente, McKellen interpreta o detetive mais famoso do mundo já bem velho, com 93 anos. Ele está aposentado da carreira de combatente do crime, vivendo asilado no litoral com uma governanta e o filho dela. É 1947 e o mundo acaba de sair da II Guerra Mundial, o que acrescenta mais tons de melancolia à situação toda. Como consta no cânone, Watson se casou e o casamento dividiu a dupla, e agora Sherlock Holmes está sozinho para enfrentar o pior inimigo que já se abateu sobre ele: o envelhecimento.

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Obviamente, esqueça a porradaria do Sherlock de Guy Ritchie ou o dinamismo técnico da série da BBC: Mr. Holmes é um filme dramático por ser calcado numa questão tão poderosa quanto óbvia: como pode enfrentar a decadência cognitiva da velhice um homem que a vida inteira viveu às custas de seu intelecto? Numa sacada ducaralho, a linha-guia do filme é construída através de um caso de Sherlock (o seu último – que é diferente daquele narrado no conto “O seu último adeus”), cuja narração feita por Watson nos livros diverge completamente do que Holmes se lembra (ou melhor, não se lembra) do caso. Assim, acompanhamos o decadente (mas ainda genial) Holmes, que agora precisa anotar nos punhos das camisas o nome das pessoas com quem se relaciona porque não os lembra, tentando reconstruir um caso há muito esquecido – reconstruindo, nesse processo, a si próprio.

Se a premissa do filme já é foda, sua execução não fica atrás. McKellen dispensa apresentações e comentários: ele não precisa abrir a boca pra você perceber que Holmes é um homem orgulhosamente amargurado: oras, vê lá se Sherlock Holmes, o grande Sherlock Holmes, ia permitir ser atingido por algo tão mundano como a senilidade? Apesar de ocupar um papel pequeno, Laura Linney segura muito bem o papel de Miss Munro, a governanta ignorante e meio assombrada pela genialidade do patrão famoso e moribundo e, mais legal ainda, Milo Parker arrebenta como o jovem Roger Munro, o filho inconformado com o destino que se desenha à sua frente e que vê no patrão quase gagá uma chance de escapar disso.

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Claro, o filme tem seus problemas, mas são praticamente irrelevantes – me incomoda o chroma-key porco usado em algumas cenas para fazer os cenários, tipo na passagem por Hiroshima – que acaba destoado um pouco do tom cru e “pé no chão” do filme.

No fim, Mr. Holmes é uma peça bonita sobre o fim (humano, muito humano) de um personagem que parecia quase não ser. Vale muito a pena!

Sr. Sherlock Holmes (Mr. Holmes, no original. Inglaterra, junho de 2015. Com Ian McKellen, Laura Linney, Milo Parker e Hattie Morahan, entre outros. Direção de Bill Condon)

Nota: 8,5

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