A gente lemos: A Insólita Família Titã

Houve um tempo em que, exceto pelo onipresente Mauricio de Sousa, o mercado brasileiro de HQs vivia de putaria. Não, não no sentido figurado, de putaria mesmo, gibizinhos de sacanagem pipocando aqui e ali. O ano era 1991 e se você quisesse fazer algo diferente (e receber algum por isso) que fizesse, mas que acrescentasse uma rala-e-rolazinho aqui e ali.

Daí nasceu a Insólita Família Titã. Produzida por Gian Danton e Joe Bennett (na época ainda Bené Nascimento) para o número de estreia da revista “Quadrinhos Adultos” (do sugestivo selo Big Bun – o logo era uma mescla de balão de fala de quadrinhos com uma bundinha, da editora Sampa),  “A Insólita…” lançava mão de três personagens (Centurião, Vésper e Tribuno) para adaptar a iluminada e pueril história da Família Marvel (mas da DC) para o contexto brasileiro. Sai o maniqueísmo de o-bem-vence-o-mal-espanta-o-temporal e entra os cinquenta tons de cinza da fome, da miséria e da violência cotidiana dos grandes centros brasileiros.

Publicada na era pré-internet, foi graças à rede de computadores que “A Insólita…” sobreviveu ao esquecimento dos tempos. Circulando por aí na forma de scan, defendida no boca-a-boca por quem tinha lido, impressa ou digital, e se recusava a esquecê-la. Até que em maio do ano passado, depois de várias ameaças de um remake, a Opera Graphica colocou outra vez a venda a versão original da HQ mesmo, com comentários dos autores, outras artes do Joe e um “plus a mais”: uma outra HQ independente de Joe Bennett, “Power”, onde o quadrinista revisita a origem do Dr. Manhattan tendo uma mulher desprezada e traída no lugar do Jon Osterman.

Como HQ, “A Insólita…” é bem legal: apesar de corrida (e só de passagem trazer a meterola que prometia na capa de “Quadrinhos Adultos”), é uma HQ interessante, um exercício de imaginação caprichado – e se jovens miseráveis ganhassem super-poderes? Será que se preocupariam com o bem comum, ou deixariam o desejo tomar conta? Por sua vez, não há muito o que dizer sobre Power: apesar de ter alguns desdobramentos interessantes, é uma paráfrase de uma história já conhecida, não vai muito além disso.

O grande problema aqui é a edição. Como revista, “A Insólita Família Titã” da Opera Graphica é uma lástima. Se por um lado os problemas são decorrentes de dificuldades técnicas (todos as artes originais foram perdidas, de modo que precisou-se restaurar uma edição impressa da história, tendo um resultado apenas razoável), tem ainda outras, de cuidado: todo o álbum é muito mal revisado. Os erros gramaticais são incontáveis, e os textos e comentários muitas vezes beiram a ininteligibilidade, fazendo com que chegar até o final do álbum seja uma batalha contra a vontade de jogar tudo pro alto.

Diretor e editor da Opera Graphica, Franco de Rosa é um cara muito legal que tive o prazer de conhecer numa GibiCon – é inegável seu conhecimento e amor pelos quadrinhos, mas é também inegável que a editora que ele dirige precisa MUITO se esmerar mais nos produtos que põe no mercado, a fim de evitar essa impressão de “material amador com ISBN” que A Insólita Família Titã deixa na gente (até porque quando você joga o número no site da Agência Brasileira de ISBN o resultado é outro livro do Gian Danton, diferente deste ¬¬)…

 

A Insólita Família Titã, de Joe Bennett e Gian Danton. Opera Graphica Editora.  80 páginas, preto e branco, R$30,00.

Nota: 4,5

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